domingo, 18 de novembro de 2012


"Mas não me lamentarei. Recebi a vida como uma ferida e proibi o suicídio de curar a cicatriz. Quero que o Criador contemple, a cada hora da sua eternidade, a fenda escancarada”.
Lautréamont – Os cantos de Maldoror III

Durante essa contemplação, desejo que Ele reflita sobre a insensatez de sua obra. Assim, a ferida será mútua. E a minha consciência ficará parcialmente aliviada.

quarta-feira, 7 de novembro de 2012


Gostaria de atingir um ponto de equilíbrio entre a acritude e a ternura. Queria me situar entre aqueles que sorvem o cálice amargo proveniente da derrocada das ilusões e os que conseguem se comover com a triste sorte dos seres que necessitam se iludir.

terça-feira, 9 de outubro de 2012


Sempre penso nesse quadro do Salvador Dalí, intitulado o Navio. Criaturas náuticas, somos destinados a realizar expansões ultramarinas do Ser. Cabe-nos promover uma constante ancoragem e desancoragem, não se prender a nenhum porto-destino. Ao mesmo tempo, o barco que somos (ou carregamos?) muitas vezes nos oprime. Temos necessidade de abandoná-lo para navegar sem aparatos, em uma nudez imemorial. Mas talvez essa liberdade não passe de uma miragem que vislumbramos nessa trajetória. 

sexta-feira, 5 de outubro de 2012



O homem é um animal redundante. Repete-se nas ações, nas anedotas que profere, no conteúdo onírico que produz e em suas imprecações. As múltiplas configurações das nuvens deveriam lhe dar lições de originalidade. 

quinta-feira, 4 de outubro de 2012


Muitos seres com os quais convivo me deixam com vontade de conviver apenas com os seres que me habitam.


Atualmente considero que a sabedoria é apenas uma tentativa patética de surfar sobre a angústia de existir.

terça-feira, 14 de agosto de 2012



Decálogo dos solitários
Para aqueles que desejam passar seus dias imersos em uma solidão plena, basta colocar em prática os seguintes “mandamentos”:
1) Confessar-se ateu.
2) Ignorar a existência de novelas, programas humorísticos e telejornais sensacionalistas.
3) Falar mal da “literatura” de autoajuda, criticar os livros da Zíbia Gasparetto e obras como o O segredo, O Monge e o Executivo e Quem mexeu no meu queixo.
4) Apreciar exclusivamente jazz, blues e música clássica.
5) Não acreditar em horóscopo, eficácia plena do pensamento positivo, astrologia, energia e gnomos.
6) Mostrar-se excessivamente sensível e generoso.
7) Manifestar uma sinceridade incondicional, até mesmo nas relações impessoais, evitando frases como “a gente precisa marcar alguma coisa”, “vamos combinar” e outros termos que usamos quando não temos nada para dizer.
8) Tornar-se muito excêntrico e singular.
9) Cultivar o pensamento e a instrução acima de todas as outras coisas
10) Colocar-se sempre como o assunto principal de todas as conversas.

terça-feira, 24 de abril de 2012



Uma flor ou um inseto morrem prematuramente, muitas vezes pisoteados por um bárbaro moderno, que anda insolentemente com seu Tablet, considerando-se o centro absoluto da galáxia. Diabólica hierarquia das espécies, regida por leis pérfidas que permitiram nossa hegemonia... 
O perfume e a beleza de uma flor são atributos que falam por si mesmos. Os insetos cumprem seu telos, são operários singelos da natureza. Quanto a nós, o que temos realmente a oferecer, além do nosso barulho e da parafernália que nos constituem?

quarta-feira, 14 de março de 2012


É engraçado ter a iniciativa de criar um blogue e saber que, além de mim, apenas as moscas virtuais o visitarão. É certo que contribuo para esse quadro desértico: o conteúdo publicado é desagradável, os aforismos são um gênero anacrônico e não faço o menor esforço para divulgar o blogue. Sei que estaria perdendo com a omissão de pessoas críticas e inteligentes, uma espécie de fraternidade secreta cada vez mais tímida e ameaçada de extinção. Entretanto, devo confessar que sinto uma espécie de júbilo secreto com esse anonimato.  Entendo como uma benção o fato de não receber de receber as visitas e os comentários dos estultos. 
Um blogue sem divulgação é uma espécie de onanismo secreto.

sábado, 4 de fevereiro de 2012


Todas as vezes que escuto frases adocicadas e as platitudes motivacionais da maldita confeitaria de autoajuda, sinto-me nauseado. Imediatamente, mergulho em uma atonia de iguana.